“É uma menina muito pura e honesta”. (Thomas Merton, sobre Joan Baez, em seus “Diários”)
Joan Baez surgiu para o mundo no Newport Folk Festival de 1959. Em 1960 tornou-se uma pequena estrela folk. Neste mesmo ano, gravou um disco. Nessa época, Dylan era um zé ninguém. O jovem bardo confessa: “Quando a vi na televisão, pensei… Essa garota precisa de um companheiro para cantar…”
Baez, que preparava seu segundo disco, o introduziu e promoveu sua entrada no circuito folk novaiorquino, interpretando suas canções e oferecendo um lugar nos palcos aos seu lado. A ascendência de Dylan foi espantosa. Menos de um ano após começar a frequentar o Greenwich Village, o reduto dos cantautores, já havia assinado com a Columbia para gravar seu primeiro álbum. Os dois cantores eram vistos o tempo todo juntos, em entrevistas, protestos, filmagens e apresentações. Era uma época de ativismo social e revolta contra a guerra do Vietnã. Dylan e Baez se destacaram como cantores de protesto. Participaram de inúmeros eventos pelos direitos civis e manifestações contra a guerra do Vietnã. Dividiram inclusive o mesmo palco no qual Martim Luther King fez seu famoso discurso “Eu tenho um sonho”, na Marcha Sobre Washington, em 1963.
Mas, nos anos 60 o tempo soprava como o vento e passava como um relâmpago. Quase num piscar de olhos, Dylan já estava com seu som eletrificado e deixando para trás os sonhos dourados da Nova York folk, de braços dados com outra musa, Sara Lownds (com quem viria a se casar secretamente) e já havia passado nas mãos de beldades como a blonde girl e musa de Andy Warhol, Edie Sedwick (que inspirou nada menos que “Like a Rolling Stone”, do próprio Dylan e “Femme Fatale”, do Velvet Underground). Dylan era agora um rock star de fama mundial. Quase sempre de óculos escuros e mergulhado nas drogas. O Dylan que emergiu nesse tempo rompeu com uma espécie de rótulo de messias político que começava a recair sobre ele: o de porta-voz de uma geração. Recusou-se a fazer de suas canções um veículo para a militância ideológica. Neste sentido, a letra de “My Back Pages” é muito reveladora, especialmente o refrão ( “ah, but I was so much older them, I’m younger than that now”). Claro que essa postura decepcionou Joan Baez. Em 1965, Dylan participou da turnê inglesa de Baez, mas não a convidou para cantar na sua. O som era outro. A filosofa também. Dylan era um dos maiores artistas do planeta. A fila andou, e Joan Baez ficou na beira da estrada. Mas não parou, continuou sua jornada solitária de singer-songwriter das causas perdidas, utopias e amores impossíveis. Em certa ocasião, Baez chegou a dizer que até muito mais tarde, quando ia cantar em eventos dedicados ao ativismo, as pessoas ainda perguntavam, “Bob vem?”. Ao que ela respondia, “Nunca mais, ingênuo!”
Passado o inverno pós-Woodstock, já consolidada como artista independente de Dylan, Baez assina um bom contrato com a A&M em 1972, e vai polindo seu som até chegar a “Diamonds and Rust”, primeiro disco não-político de sua carreira. Um disco sem “mensagem” explícita.
No fim de 1974, Joan recebe uma surpreendente ligação telefônica de Dylan, seu velho e desaparecido parceiro, de uma cabine telefônica, provavelmente lhe convidando para participar da futura Rolling Thunder Revue, a famosa turnê de 1975, que virou documentário dirigido por Scorsese. Dylan havia se separado de Sara, estava preparando o lançamento de Blood on the Tracks, uma disco inteiro sobre o processo de separação e, mais uma vez, abalou as estruturas de Baez. Maldito fantasma que não para de me assaltar. Maldito — e bendito — telefonema.
Diamonds and Rust sai em 1975. Baez faz duas canções para Dylan e grava mais uma de sua autoria, “Simple twist of fate” (de Blood on the tracks), que, ingenuamente, acha que foi feita para ela. A faixa-título, provavelmente a obra-prima de Baez, são as impressões da cantora após o telefonema e contém toda uma anamnese de sua relação com Dylan.
Raios me partam
Lá vem o teu fantasma outra vez
Mas isso não é incomum
É que a lua está cheia
E calhou de você ligar
E aqui estou
Mão no telefone
Escutando a voz que me cativouHá um par de anos-luz
E me lançou direto no abismo
Há um verso que soa dolorosíssimo, e eu não duvido nada de que Dylan, num de seus rompantes, possa ter dito algo assim direto — na lata — para Baez*:
Você disse que minha poesia era pobre
E, logo a seguir, Baez descreve a ascensão meteórica de Dylan — na trilha que ela mesma abriu — e a complexidade de sua personalidade. Assim como seu instinto materno, seu desejo secreto de domesticar Dylan — ela era a Madonna — em seus braços maternais:
Você mal adentrou o cenário
E já era um lenda viva
Um fenômeno bruto
O vagabundo original
Você se perdeu em meus braços
E lá ficou
Vagando por um tempo naquele mar
A Madonna era sua de graça (…)
E iria o manteria a salvo
Baez então reconhece que Dylan era o supremo poeta, capaz de fazer com as palavras o que ela mesma gostaria de ter feito e nunca conseguira. Agora, que tanto tempo se passara e ela conseguia olhar para trás com aquela dolorosa sobriedade que coloca as coisas em seu devido lugar, não podia negar que o amara demais; reconhece o carisma de Dylan, o grande artista que é, tão bom com as palavras e em deixar as coisas no ar — as nuances, as parábolas, as metáforas —, reconhece também, no meio dessa vertigem causada pela lucidez da vida adulta, que precisa de um pouco desta indefinição, agora que tudo voltou tão claramente.
Joan Baez, aos 34 anos, não aceita mais receber diamantes e ferrugem como oferta:
Já paguei por tudo.
A outra canção para Dylan é “Winds of Old Days”. Mas essa já é outra história.
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* Quando pesquisava para tentar ilustrar esses texto, descobri que Baez escreveu uma canção para Dylan em 1972, “To Bobby”, do álbum “Come From The Shadows”, basicamente pedindo que ele voltasse ao ativismo. Eles tiveram uma breve conversa —a primeira em quatro anos — e ele lhe disse que um verso, que ela já havia retirado da canção, assim como a música inteira, eram nojentos e terríveis.
O Wilco está com single novo, Evicted, que faz parte do novo álbum, Cousin. Jeff Tweedy explica em sua newsletter, Starship Casual:
Acho que é um disco pop. Art-pop para ser mais específico. Não "pop" como usamos para "pop"-ular. Isso não depende tanto de nós. É mais ou menos parecido com o que dissemos sobre Cruel Country ter sido a nossa ideia do seria a música country e muita gente ter dito: "O que?!” isso não parece Colt Steed!" (ou algum outro nome de mega-estrela do country que soe plausível).
Para mim, a música pop será sempre o género que as pessoas também costumavam chamar de "Bubblegum". É doce e aparentemente destinado ao consumo descuidado, mas tem um poder semelhante ao do Cavalo de Troia para transformar mentes e corações. Eu a amo. A amei desde sempre. Este álbum pop em particular, gravado em grande parte durante o inverno de Chicago, adiciona uma camada glacial de gelo açucarado. Não gelo frio e insensível, mas agradável, para possamos deslizar sobre essa superfície — doce e gelada — e nos sentirmos um pouco inseguros a respeito de nós mesmos — um pouco menos sisudos. E açúcar por causa, vocês sabem, de toda o lance do "bubblegum pop" — querendo traduzir o que esse gênero significa para mim. Doce e fácil. Brilhante e triste. Quando vi a arte de Azuma Makoto ( cuja obra Flower Art, ilustra a capa do disco) quase não acreditei no que estava vendo, ao perceber o quanto esse disco se parece comigo. Parecido com a época de menino, quando achava que um doce era demasiado bonito para ser devorado. Mas comia-o mesmo assim. O álbum estará disponível no dia 29 de setembro.
O single:
“Toquei durante 60 anos. Já é tempo suficiente": o guitar hero Vini Reilly fala sobre transtorno de estresse pós-traumático, a vida nas ruas e a menina que o salvou
Em sua primeira entrevista em década, o líder-eremita da banda Durutti Column, outrora descrito como "o melhor guitarrista do mundo", revive a sua extraordinária vida, das gangs de Manchester à Factory Records.
Entrevista ao The Guardian, em 21 Jul 2023.
"Não há cinto de segurança. Não há segurança. Pode ser que nem consigamos chegar", ri Bruce Mitchell, ao me buscar na estação de trem de Manchester em um Austin 7 de dois lugares, que data de 1932.
As minhas pernas estão imprensadas contra o peito, a mão de Mitchell roça na minha coxa a cada troca de marcha enquanto uma brisa suave bate nas janelas laminadas. Esse homem de 83 anos está me levando para conhecer a figura enigmática por detrás do Durutti Column — Vini Reilly. Além de tocar bateria com ele desde 1981, Mitchell é também seu empresário.
Já se passou uma década desde que Reilly deu sua última entrevista e, mesmo antes disso, elas eram escassas. Chegando aos setenta anos no próximo mês, ele vive uma vida eremítica, saindo raramente de casa. Em 2010, teve o primeiro de três AVCs. A sua mobilidade, que ficou reduzida, afetou a sua capacidade de tocar e atuar. Foi à falência e perdeu o seu apartamento. Houve também períodos de grave doença mental. "Fiquei completamente louco", diz-me mais tarde. "Se calhar, é provável que ainda esteja."
Dirigindo pela Palatine Road, onde outrora ficavam da escritórios da revolucionária gravadora independente Factory Records, Mitchell me conta que "Vin sempre esteve perto do limite. Mas que talento musical espantoso! Nunca conheci nada assim". E não são apenas os seus amigos e colaboradores. John Frusciante, dos Red Hot Chili Peppers, chamou a Reilly "o melhor guitarrista do mundo", e Brian Eno chamou certa vez o álbum LC, do Durutti Column, de seu disco favorito de todos os tempos.
O Durutti Column foi fundado pelo dono da Factory, Tony Wilson, em 1978, a partir das cinzas de uma banda punk chamada Fast Breeder. Reilly, que já tinha sido guitarrista de outra banda, Ed Banger and the Nosebleeds, juntou-se a eles, e a banda contribuiu com duas faixas para A Factory Sample, uma coletânea em forma de EP de 7 polegadas que também incluía Joy Division e Cabaret Voltaire, e que se tornou o primeiro lançamento da gravadora.
A partir do álbum de estreia, em 1980, The Return of the Durutti Column (lançado com uma capa de lixa projetada para arranhar ambos os lados de qualquer LP que fosse ali depositado colocado), Reilly lançaria 20 álbuns de estúdio como Durutti Column nas três décadas seguintes, com Mitchell e o baixista e tecladista Keir Stewart formando o núcleo da banda. Evitando o punk mais visceral ou o sotaque pós-punk angular preferido por muitos músicos daquela época, Reilly preferia um estilo mais sutil, suave, sensível e expressivo — ele nunca usou uma palheta, pois achava o som muito áspero — mesclando jazz, clássico e flamenco. Sua sonoridade era esparsa, mas complexa, tecnicamente apurada e tão ardente e fluida quanto lava escorrendo pela encosta de uma montanha.
Chegamos em um beco sem saída onde ficava a casa de Reilly. Ele nos recebe na porta com um sorriso discreto e um gentil aperto de mão, um cigarro enrolado meio aceso entre os dedos manchados de nicotina. Seu cabelo um pouco comprido ainda está lá, embora mais liso e grisalho agora, assentado sobre seu corpo desesperadamente magro — uma doença ligada ao transtorno de estresse pós-traumático fez com que ele lutasse a vida inteira para tentar se alimentar bem.
Nos sentamos no jardim, com Reilly ao chão, no gramado. Estamos aqui para falar sobre Time Was Gigantic ... When We Were Kids, álbum do Durutti Column de 1998 que acaba de ser relançado, mas Reilly se ocupa de seu assunto favorito do momento: microplásticos no ecossistema e a crise climática. "Estamos condenados", ele reclama.
Reilly tem uma voz surpreendentemente terna. Apesar dos meus esforços para captar cada palavra, por vezes as suaves rajadas de vento levam-nas embora. Às vezes, ele fala tão baixinho que é como se tivesse engolido as palavras antes de as deixar sair. O chilrear dos pássaros é mais alto do que a nossa conversa, mas cria um momento de feliz sincronia, lembrando uma das peças musicais mais amadas, duradouras e repletas de cantos de pássaros compostas por Reilly: “Sketch for Summer”.
Time Was Gigantic ... foi o último álbum lançado pela Factory Records, o que significa que Reilly encerrou a ilustre história da gravadora, que tinha em seu catálogo New Order, Joy Division, Happy Mondays e outros. Wilson, que era o empresário de Reilly e também o presidente da gravadora, não gostou do disco e desencorajou a decisão de Reilly de cantar na maioria das canções: "Pensei: quem é ele para me dizer isso?", explica Reilly. "Que se foda. Se tenho algo a dizer e quero cantar, insistirei e o farei". Mitchell faz uma analogia: "Era como se alguém se debruçasse sobre os ombros de Van Gogh e dissesse: “Você está usando o tom de amarelo errado'."
Depois fizeram as pazes.. "Tony era um cara maravilhoso e eu o amava; ainda o amo", diz Reilly. Foi Wilson, juntamente com o co-fundador da Factory, Alan Erasmus, que convenceu Reilly de que ele precisava de continuar a fazer música depois do fim da encarnação original do Durutti Column (os outros membros viriam mais tarde a integrar o Simply Red). "Foi fantástico da parte deles terem me apoiado", diz Reilly. "Eu estava muito deprimido e fora de órbita. Tony era muito paternalista; e eu estava sempre à procura de uma figura paterna."
O pai de Reilly morreu quando ele tinha 16 anos e, com a deterioração das relações familiares, ele acabou por viver nas ruas, onde se envolveu em um mundo de gangues e violência. Em um tiroteio, um amigo foi baleado e morreu em seus braços. Cansado dessa vida sem perspectiva, Reilly diz que provocou deliberadamente alguns membros de gangues de Moss Side, na esperança de que eles o matassem. Em vez disso, acabou levando um tiro — um alerta — que passou de raspão na lateral da cabeça, o deixando temporariamente surdo. "Não sabia que estava deprimido, porque àquela altura ainda não tinha sido diagnosticado", diz hoje, olhando para trás.
O encontro com Mitchell foi decisivo. "Quando conheci Bruce, estava prestes a me suicidar", revela. "Estava na terceira tentativa." Ele explica que um gatilho defeituoso foi o motivo de não ter conseguido. "Bruce levou-me para sua casa. Minha depressão dissipou-se por causa de uma menina muito preciosa [a filha pequena de Mitchell]. De repente, voltei minha atenção para ela e parei de concentrar-me no que acontecia dentro do meu próprio cérebro. Isso me fez continuar. Salvou literalmente a minha vida. Descarreguei minha arma e atirei-a no rio Mersey". Reilly não gosta de pensar nesse período de angústia. "Tudo isso faz parte do passado", diz ele. "Passei por 13 psiquiatras que me acompanharam na recuperação da doença. Portanto, já chega disso."
Desde menino Reilly demonstrou possuir um ouvido natural para o piano, tocando em casa o instrumento que pertencia ao seu pai. Logo sua atenção voltou-se para a guitarra e ele se tornou um guitarrista obsessivo, isolando-se no seu quarto para tocar sem parar, por horas. Enquanto os seus colegas imitavam os guitar hero cheios de glamour da era do rock,, o adolescente Reilly foi magnetizado pela música dos Índios Tabajaras, uma dupla de violonistas brasileiros, cujos violões Reilly considerava os mais mais pungentes que já havia escutado.
Após a ajuda e chancela de Wilson, ficou claro para todos o que o assistiram que Reilly era realmente um grande guitarrista. Quando Morrissey se lançou em carreira solo, recrutou Reilly para tocar em seu álbum de estreia, Viva Hate, de 1988, preenchendo a lacuna deixada por outro mestre, Johnny Marr. Mas Reilly rejeita a ideia de ser um virtuose. "Vá a qualquer bar em Córdoba, na Espanha, e os sujeitos que costumam tocar ali me fazem passar por ridículo", diz ele. "Nunca vão gravar nenhum álbum e ninguém nunca os ouviu, mas são os melhores. Mesmo."
Reilly é desdenhoso em relação à sua própria música. "Quando acontece de escutá-la, acho enfadonha", diz. "Mas já está feito. Já expressei tudo o que precisava na época em que tocava." Digo-lhe que um colega me revelou que gostaria muito que a faixa Otis, de 1989, fosse tocada em seu funeral. "Peço-lhe desculpas", dando uma risada, antes de desdenhar a beleza da canção, na qual uma guitarra cintilante gira em torno de samples vocais oníricos de Tracy Chapman e Otis Redding. "Tudo não passava de diversão."
No entanto, sua música continua a ecoar nos dias de hoje. O Durutti Column pode ser ouvida em programas de TV aclamados, como Master of None ou na segunda temporada da série The Bear, tendo dezenas de milhões de reproduções no Spotify. "Nada disso lhe interessa", diz-me Mitchell mais tarde no pub. "Tento mostrar para ele no notebook, mas ele não demonstra entusiasmo algum — é uma espécie de distanciamento."
Embora Reilly não se pronuncie a respeito da grandeza de sua própria música, Mitchell demonstra bastante entusiasmo. "Tenho admiração por ele", me diz. Quando tocávamos "For Belgian Friends" ao vivo, eu nunca queria tocar nela porque era como se eu pudesse pesar a mão e estragar tudo... Só queria vê-lo da plateia. Era uma coisa tão espantosa. Quando ele a tocava sozinho, a sala inteira ficava sem fôlego".
Há imagens no YouTube, feitas em 2020, de Reilly tocando em sua sala de estar e não é o que poderia se esperar de alguém que sofreu três AVCs. Ainda assim, não é suficientemente bom para Reilly. "Continuei a tocar depois dos meus acidentes vasculares e cheguei alcançar um bom nível, mas nunca mais cheguei nem perto de onde já estive", explica. "Não consigo mesmo tocar guitarra. Parece ridículo. Soa ridículo. Tenho uma boa desculpa para parar agora, porque desenvolvi artrite", diz, apontando para a mão, enquanto olha para as suas unhas compridas e resistentes, que têm a forma de pontas de lança uniformemente imaculadas para tocar.
Terá ele feito as pazes com a ideia de se desligar permanentemente de um instrumento que tem sido uma extensão de si próprio ao longo da vida? "Sim", diz ele, com naturalidade. "Faço 71 anos no próximo ano. Comecei a tocar aos 11 anos — já são 60. É tempo o suficiente. Tenho a sorte por ter chegado até aqui e ter tido uma vida fantástica."
Enquanto Reilly se prepara para aposentar um instrumento que se tornou verdadeiramente seu — embora Mitchell diga que continua a gravar de vez em quando — parece haver um ligeiro vislumbre de reconhecimento pela beleza que criou. "Expressou algo para mim", diz ele, referindo-se a um raro momento recente em que ouviu músicas antigas do Durutti Column: "Foi bem emocionante. Havia uma tristeza, mas não uma tristeza desagradável. Na verdade, foi adorável. Foi a primeira vez que pensei: bem, você realizou alguma coisa".
A playlist desta edição:
Alguns álbuns de despedida (o famoso face a face com a morte):
“Lulu”, Lou Reed e Metallica
“Blackstar”, David Bowie
“The wind”, Warren Zevon
“You Want It Darker”, Leonard Cohen -
“Purple Mountains”, David Berman
“Donuts”, J Dilla
“Brainwashed”, George Harrison
“The Tree of Forgiveness”, John Prine -
“A Tempestade”, Legião Urbana
“The Gospel According to Water”, Joe Henry
“Another Thought”, Arthur Russell
“Red Cross”, John Fahey
“Last Sessions”, Mississippi John Hurt
“Mark Hollis”, Mark Hollis
“New World Order”, Curtis Mayfield
“Woods 5: Grey Skies & Electric Light”, Woods of Ypres
“Introduce Yerself”, Gord Downie
“Cake or Death”, Lee Hazlewood
“The Argument”, Grant Hart
“12”, Ryuichi Sakamoto
“A Crow looked at me”, Mount Eerie
“Painting of a panic attack”, Frightened Rabbit
“Dance Music”, MasterSystem
“Chance and time”, James Varda
“At the cut”, Vic Chesnutt
El Mató a un Polícia Motorizado é a principal banda do atual rock argentino. Seu mais recente álbum, Súper Terror, vai estar nas principais listas de melhores de 2023. O rock alternativo da banda agora se reveste de elementos synthpop e eles cometem um registro bastante oitentista, cheio daquela melancolia fina pós-pandêmica, tão própria de quem está crescendo e perdendo a fé na humanidade.
“Medalla de Oro” é linda demais: “Hay una luz que arrasa com tudo…”
Eles ao vivo no inevitável KEXP:
Os Pretenders também estão com single novo — “A Love”. Esse tipo de pop parece fácil, mas é extremamente difícil de fazer e de compor. Kurt Cobain passou a vida tentando compor esse tipo de música. Chrissie Hynde, do alto se seus 71 anos ainda consegue tirar alguns coelhos da cartola. Algumas das guitarras mais bem gravadas e arranjadas do ano.
O Big Thief fez um dos discos mais bonitos de 2022, Dragon New Warm Mountain I Believe in You. Eles são esquisitinhos, mas bons demais. O single novo é uma pancada.
Ao vivo, fica ainda melhor:
Entre 1974 e 1976 Neil Young estava numa fase iluminada. Compondo o repertório que seria usado em Comes a Time e Rust Never Sleeps, dois de seus álbuns mais contundentes. Um acústico, country, clássico. O outro, a mescla da esporreira elétrica que os punks tiveram que respeitar com os habituais violões dos quais ele nunca abriu mão. Aliás, o velho Neil nunca abriu mão de fazer o que quisesse. Agora, depois de quase 50 anos, ele lança Chrome Dreams, álbum que seria lançado em 1977, mas foi engavetado e do quais a maioria das canções foi distribuída entre os álbuns supracitados e em American Stars 'n Bars.
Uma obra-prima que resistiu ao tempo.
Que belíssima edição, Sérgio! Passei a semana esperando o momento certo para ler, com foco e total atenção. Li a primeira seção ouvindo "Diamonds and Rust", e foi uma aventura, devo dizer. Acho que não era nada fácil conviver com Dylan, hahaha! A música, que já tinha um peso grande para mim, ganhou significados ainda mais profundos. Muito obrigado por esse texto, digno de qualquer coletânea sobre Dylan/Baez.